sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Isabela segue a vida


Tomara que este inverno com dois a quatro graus, vento Sul e chuvas torrenciais acabem logo! Isabela imaginava, ao olhar essa gente encasacada, de toca e fisionomia de profunda tristeza. Eustáquio falecera há mais de anos e não quis firmar outro compromisso com ninguém. Bem que o Deodato insistira, mas soube dizer não e ele desistiu.
Isabela tem um livro nas mãos. Para e analisa as estações. No verão as pessoas reclamam do sol tórrido, sufocante, secura, suadouro que acaba com as roupas e pedem uma enxurrada, por mais graves que sejam as conseqüências.

Outono. As velhas folhas esparramam-se pelas calçadas e seu Onofre, coronel do Exército reformado, tem a vassoura na mão o dia todo. Os varredores queixam-se, fadigados. Olga prefere o outono porque é a ocasião em que as vitrines apregoam liquidações. Vestia elegante blazer azul marinho, botas pretas e dava muitas voltas pelos shoppings da cidade. Amava os shoppings e afirmava ser como uma lavagem cerebral, porque ao voltar ao seu apartamento sentia-se renovada. Sem comprar tudo que lhe agradou, senão o filho Edinho faria críticas e lembrava-lhe que o dinheiro cada vez está mais curto. A Presidenta Dilma parece detestar aposentados! – destacou.
Isabela coloca o livro debaixo do braço. Para e analisa as estações. No verão as pessoas reclamam do sol tórrido, sufocante, secura, suadouro que acaba com as roupas e pedem uma enxurrada, por mais graves que sejam as conseqüências.

Quis até comprar umas das saias de algodão, a preços em conta, já pensando no verão e na primavera do próximo ano. Desistiu. Não desejava entrar em discussão com o filho. Pior mesmo é experimentar roupas. Que canseira!
Achou melhor distrair-se a observar a garotada que saía dos colégios. Um fuá! Um batia na cabeça do outro, beliscava, apelidava com nomes hostis, como o que ouviu uma loirinha gritar a um gordinho. “Songamonga, vê se faz ginástica, caminha ou reduz esse estômago!” O garoto correu desesperadamente e ainda bem que seus pais já o aguardavam. Entrou como um foguete no Passat.
Com fome, dirigiu-se a uma lanchonete e tomou uma xícara de café sem açúcar, três pães de queijo e ficou a notar os que entravam e saíam. O garçom foi rápido, esquentou os pãezinhos no aparelho de microondas. Recordou que antigamente era preciso ter um forninho elétrico para aquecer guloseimas e comidas. “É – disse de si para si – o mundo moderno cada vez fica melhor! Veja só, tenho um cobertor elétrico que me esquenta! Uma maravilha!” Presente de uma afilhada rica,
Lá fora, viu as árvores desfolhadas e amarelas. Não eram muitas, mas é como a nossa vida, pois temos a primavera, verão, outono e inverno.
Já terminava a tarde e o sol sumia no poente. Pôs a toca azul na cabeça por causa do sereno, e foi indo, sempre a pensar. Um arrepio de fio percorreu-lhe o corpo, no entanto já chegava à casa. O neto também chegou.
Entrou no apartamento, ligou a televisão e olhava as novelas. Murmurou: “Que coisa mais boba o prefeito trocar a mulher por uma mocinha interessada nos seus bens!” Levantou-se, enjoada da história sem pé nem cabeça. Foi ao banheiro, acendeu a luz e ao mirar-se no espelho levou um susto. “Deus meu, como estou pelancuda!”
Olhou-se demoradamente e ao tocar com a ponta dos dedos nos cantos dos olhos, sentiu que eram muitas as rugas. Suspirou profundamente e ressaltou: “Eu vivo!”

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